segunda-feira, 13 de junho de 2016

Um texto por Orlando







E por muitas outras tristezas

Por Valquíria Vita
valquiria@txtconteudo.com.br


Meus melhores amigos são gays.


Apesar de estar escrevendo isso, eu nunca penso neles como gays. Penso apenas que são os meus melhores amigos. E ponto. Alguma coisa além disso importa?


Infelizmente, a sociedade não pensa assim — e aqui incluo pessoas bem próximas a mim. Já perdi as contas de quantas vezes tive que disfarçar ou distrair meu melhor amigo, porque alguém na rua chamou ele de ‘veadinho’, de ‘mulherzinha’, sem nem se preocupar em estar nos constrangendo em público; quantas vezes eu vi gente segurando uma risada ou virando o rosto; quantas vezes me perguntaram: “Tu é gay também? Já que tu fica andando com ‘essa turma’…”


Não sou a favor do discurso da vitimização, mas às vezes me pego pensando que, se essa situação, de estar próxima, já me incomoda muito, imagina como é para quem tem que lidar com isso, de verdade, dia após dia.


No domingo, a tragédia que matou 50 e feriu mais 50 em uma boate em Orlando, nos Estados Unidos, causou uma dor muito grande. Não apenas porque 50 pessoas perderam a vida (embora isso já seja dor suficiente), mas porque o atirador que cometeu o atentado acreditava estar fazendo um bem à humanidade.


É com essa tragédia, totalmente sem sentido, que iniciamos essa semana triste. É com essa notícia que iniciamos a segunda-feira com medo de viver no mundo em que vivemos. E é com esse mal estar geral, que somos forçados a refletir o óbvio: Intolerância contra os gays não faz sentido. Intolerância contra qualquer tipo de pessoa não faz sentido.


Não existe uma lei universal que diz o que é certo e o que é errado, o que é melhor e o que é pior, o que é normal e o que não é. E, principalmente, não existe “essa turma…”. É todo mundo igual.


Parece tão simples — e dói saber que foram as próprias pessoas que complicaram tanto com o que nunca deveria ter sido complicado. Dói também tentar escrever esse texto, que nunca nem deveria ter sido necessário.


Hoje não vamos nem entrar na discussão de como as redes sociais, depois dessa notícia, ficaram cheias de comentários que propagam o ódio, a intolerância e, principalmente, a ignorância. Já falamos sobre isso no texto dos Opinadores de Facebook, e sobre como eles são extremamente desnecessários.


Vamos tentar focar no bom, ao invés do ruim (embora isso seja muito difícil). Entre os que se manifestaram sobre o assunto, está o cantor Elthon John, que citou um dos discursos de Martin Luther King sobre intolerância e discriminação: “o ódio não combate o ódio: só o amor tem esse poder”.


E é essa a mensagem que deve prevalecer depois desse acontecimento cruel. Sim, já estamos em 2016, mas mesmo assim ainda precisamos lutar pelo fim do discurso do preconceito. Passe essa ideia para os seus pais, para os seus amigos, para o seu namorado, para os seus filhos. Porque esse discurso do ódio não está longe de nós, lá em outro continente, representado apenas nos grupos terroristas. O preconceito está bem pertinho e todo mundo sabe.


Talvez com a propagação (e com a insistência) do discurso do amor — o único discurso que deveria existir — um dia, viveremos em um mundo em que as boates não precisarão mais ser definidas como “boate gay” ou “boate hétero”. E, principalmente, um mundo em que as pessoas não precisarão mais ser rotuladas como “gays” ou “não gays”, e sim, apenas como… pessoas.

Texto original publicado aqui:
http://levelcult.com.br/1098-2/

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