sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

New Year’s Eve na Times Square – a experiência

Aviso: por mais exagerada que possa parecer a descrição dos fatos, eu juro que foi exatamente assim que aconteceu.

     Existem algumas coisas nessa vida que você deve fazer apenas uma vez. Para mim, uma dessas coisas foi ter viajado de ônibus nos Estados Unidos. Atravessei cinco estados inteirinhos com um ônibus pinga pinga que parou em 80% das cidades desses estados. Em grande parte dessas paradas eu era obrigada a descer do ônibus e pegar as malas, para embarcar em outro ônibus. Do Kansas (onde eu estava morando) até Nova Iorque (onde eu passaria o Natal e Ano Novo de 2012/2013), a viagem levou 37 horas. Depois de uma experiência dessas, você pensa que já teve sua cota de indiada por pelo menos um ano. Só que não. Porque vocês e seus amigos decidem passar o Reveillon na Times Square. Vocês e mais muitos milhões de pessoas.
     Nós e mais esses milhões de turistas estávamos empolgadíssimos com a ideia de ver a bola cair na Times Square. Mas ver a bola cair, meus caros, não foi nada como a gente imaginou. A gente foi ingênuo também. Todo mundo nos dizia 'you guys are crazy'. E, por algum motivo, a gente não os escutava. Primeiro aprendizado: quando alguém disser 'vocês são loucos', acredite. Não tente ir contra o que as pessoas estão te recomendando. Elas sabem do que elas estão falando.
     Então, contrariando a todos, colocamos grande parte das roupas de inverno (porque estava muito, muito frio) e fomos até a Times Square às 17h do dia 31 de dezembro de 2012. Cinco da tarde pareceu um horário razoável _ não eram 14h, hora em que as pessoas lunáticas chegam pra ficar quase na grade, mas também era um horário suficientemente bom pra pegar um bom lugar. Só que não era.
     Quando a gente chegou lá, a cena era de Titanic, naquela hora que eles fecham as portas das terceira classe para a terceira classe não subir no barco e se salvar. Todas as ruas que davam na Times Square estavam fechadas. E os policiais gritando: move ooon, move ooon guys. Dai a multidão ía. Chegamos até a Rua número 52, onde disseram que dava pra entrar. Tinha muita gente naquela entrada, gente que eu não conseguiria nem dimensionar. E tinha uma fila para entrar na rua. Nesse momento, começamos a ser brasileiros (mesmo que entre os meus amigos havia um alemão e um espanhol). Nos metemos no começo da fila e entramos, fingindo não entender inglês, quando a galera começou a gritar "There is a lineee, is a liiineeeeee". Eu sei, horrível, mas vocês tem que entender que a gente queria muito ver aquela bola.
     Só que o universo nos castigou por ter furado a fila, e, quando os policiais tiraram uns cavaletes na esquina e a gente pode entrar, toda a galera de trás começou a empurrar. Mas não empurrar estilo Planeta Atlântida ou carnaval do Rio. Empurrar como se estivessem lutando pelas suas vidas. Não tinha nem como sair de lá. Não tinha como desmaiar também. Se eu morresse lá, meu corpo teria sido levado pela multidão. Era japa, era indu, era brasileiro, paraguaio, italiano, era gente com mala, gente com caixa de pizza... Depois que passou a parte da empurração, chegamos no lugares determinado pelos policiais. Só que era horrível! Não apenas não víamos a bola, como não víamos nem o prédio onde ela estava. E, contrariando nossas expectativas, não tinha telões! Nosso instinto de 'vamos ver essa bola de qualquer jeito' falou mais alto. Fizemos um plano de pular a cerca quando nenhum policial estivesse olhando, para entrar em um Mc Donalds na esquina, atravessá-lo e chegar em um outro bloco. Conseguimos. Não sem antes passar pelo momento 'sardinha entalada' número dois. Naquela hora eu fui tão empurrada que fui jogada, literalmente, em cima de uns cavaletes. 
     Com isso, deixamos uma galera pra trás. Conseguimos um lugar muito melhor, onde víamos tudo, estávamos na rua 50, há uns nove blocos do prédio onde tudo ia acontecer. Tivemos uns breves minutos de felicidade e sentimento de vitória. Até nos abraçamos.
     Só que a felicidade durou pouco e o frio começou a bater. Demais. Estava zero grau, não estava nem negativo, mas tinha um vento que castigava. E tínhamos de ficar parados por sete horas. Tentamos sentar no chão, um encostando as costas no outro, para nos apoiarmos, e fizemos uma pirâmide humana de calor. Botei uma caixa vazia de Pizza Hut no chão pra não gelar a minha bunda. Aguentamos por duas horas que pareceram meses. Estávamos o retrato da dor, teve gente que até tirava foto de nos, oito amigos, tremendo juntos. Eu tentava escrever mensagens de Feliz Ano Novo no meu cel pra mandar pra uns amigos e não conseguia mexer os dedos. 
     Nada está tão ruim que não possa piorar e, nessa hora, todo mundo começou a ter muita vontade de fazer xixi. Porque fome e sede dá para aguentar, mas sete horas sem fazer xixi é muito desafiador. Ainda mais no frio. Você tem que preparar o corpo _ só tínhamos tomado um pouco de água no almoço e nada mais depois _ e o psicológico _ repetindo 'eu não estou com vontade de fazer xixi, eu posso aguentar até depois da meia noite'. Só que não adiantou. O problema não era que não dava pra sair do espaço para ir ao banheiro. O problema era que NÃO TINHA banheiro. Dá para acreditar? O maior réveillon do mundo e não tem banheiro químico? Nessa hora eu comecei a entender o que uma amiga tinha me falado, que algumas pessoas usam fralda pra ir na Times Square. Eu não tinha acreditado. 
     Conseguimos, depois de muitos 'nãos', um restaurante que nos deixou usar o banheiro. Depois disso, tudo pareceu menos sofrido. E já eram quase 23h. Tínhamos aguentado já seis horas de frio. Então finalmente entramos no clima de réveillon na Times Square. Aguentamos mais uma hora tremendo, quando teve os shows do Psy e da Taylor Swift, mas não conseguimos ouvir nada porque a Times Square não tem caixas de som. Só escuta quem esta no primeiro bloco. Eu penso em milhões e milhões de pessoas perto de nos e atrás de nos que saíram frustradas de lá, achando que iam para 'a balada' do ano, quando, na verdade, ficaram no maior silêncio a noite toda.
     A única parte realmente boa foi a contagem regressiva, que começou no um minuto. Dai todo mundo gritou muito. Quando deu meia noite, a bola desceu, mas foi super rápido, e ela desce a apaga, e todo mundo (incluindo os brasileiros atrás de nos) falaram: "é isso?". Teve uns fogos de artifício, mas nada do que achávamos. Foram tipo 20 segundos de fogos. E acabou. Até em Arroio do Sal eu vi mais fogos, gente. Até em Caxias, onde eu moro, eu vi mais fogos.
     A gente passou horas de frio, xingamentos, privação de necessidades básicas, e não valeu à pena. Valeu só por duas coisas: para poder escrever esse texto e deixar dito que passar o réveillon na Times Square é uma péssima ideia para o seu final do ano; e para poder contar pros meus filhos e netos que, quando eu tinha 25 anos, eu e mais sete amigos sofremos o calvário para poucos segundos de emoção. Nos tiraram comida, bebida, espaço pessoal e banheiro. Mas essa história, pelo menos, ninguém nunca vai poder nos tirar. 




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