quarta-feira, 27 de junho de 2012

Quando a gente trocou a piscina pelo asilo


As férias da universidade dos Estados Unidos, como no Brasil, duram três meses do verão. Suponho que deva passar rápido, se você esta viajando por ai. No meu caso, que estou trabalhando – e dormindo – esta passando mais devagar do que uma tartaruga sem perna. Tento pegar o maior numero de matérias possíveis pro jornal, pra me ocupar. Se alguém esta lendo esse jornal no verão eu não sei, mas anyway, escrever pra quase ninguém eh uma fase que todo jornalista pega.

Alem de entrevistar e escrever e entrevistar e escrever, eu durmo bastante. E pego sol na piscina. Não tem piscina onde eu moro, mas tem num condomínio aqui perto. Eu entro e finjo que sou moradora e ninguém nunca fala nada. Who cares, não tem quase ninguém na piscina mesmo. Pois bem, eh uma vida muito boa, admito. Mas jah faz desde o inicio de maio que estou nessa.

Comecei a achar varias coisas diferentes pra fazer, pra sair um pouco dessa rotina. (Era pra eu estar me preparando pras minhas aulas de francês e espanhol, mas ser autodidata e estudar em casa nunca foi meu forte.) Nessa busca pelo o que fazer eu jah passei uma tarde ajudando o escritorio internacional a explicar um programa deles pros calouros que estão chegando (passei horas falando a mesma coisa e entregando folhetinhos.) Já tentei ser conversation partner de alunos que estão aprendendo inglês. Já virei garçonete e passei duas manhas servindo hambúrgueres pra jogadores de futebol americano (o que me rendeu quase $60). E jah passei uma tarde carregando pneus de bicicleta e os separando por tamanho (coisa que nem sabia que existia) para o Don Smith.

O Don Smith eh o morador aqui de Pittsburg que da as bikes pros estudantes internacionais. Ele eh a pessoa mais boa que Deus jah colocou na face da Terra, e eu comecei a ter ainda mais certeza disso nesse verão. Todas as tercas feiras, há 34 anos, veja bem, 34 anos, o Don Smith dirige a van branca dele ateh um asilo na saída de Pittsburg e passa duas horas cantando e conversando com os velhinhos. Ele sempre tenta levar estudantes junto. E essa terca eu fui. Confesso que fui porque nada tinha pra fazer, e arrastei a Bruna junto. Mas no fim, acabou sendo muito mais legal do que a gente esperava.

Entao, numa terca feira de 40 graus (não estou exagerando quanto a temperatura) trocamos a piscina pela van do Don Smith e fomos com ele pro asilo. Conversando com ele no caminho comentei que esse calor tava demais pra mim e ele respondeu “esse calor eh uma dadiva”. Não reclamei mais de nada depois disso.

Entrar num asilo eh sempre um choque, não importa em que pais você esta. Diferente dos outros lugares daqui, a porta da frente era trancada. O Don disse que eh pra evitar que os velhinhos saíssem, porque certamente eles iriam se perder se isso acontecesse. Quando a gente chegou la eles estavam todos, tipo, uns 70 velhinhos, sentados nas suas cadeiras de roda nos esperando. A nossa primeira reação foi tipo UOU. Não sei se eh porque eu estou desde janeiro passando meus dias com gente de 20 e poucos anos, ou se eu não estava esperando ver tantos velhinhos no mesmo lugar. Mas a primeira impressão foi um choque.

O segundo choque veio quando a gente viu que uma das enfermeiras era uma guria que a gente sempre ve no bar daqui dançando ateh o chão, com cabelão, maquiagem, vestido curto, saltao e tatuagem na coxa. A tatuagem sempre nos levou a crer que ela era stripper. E foi bem desconfortável quando a gente viu ela la, de roupa de hospital, cuidando dos velhinhos (nunca mais vou tentar adivinhar a profissão de alguém por causa das roupas ou das tatuagens).

O Don começou a se preparar pra cantar pros velhinhos e o que a gente tinha que fazer, basicamente, era entregar os livros com as letras das musicas pra eles e dar um oi, pedir como estavam, essas coisas. Depois, a gente tinha que ter certeza que eles estavam na pagina certa de cada musica (a maioria não conseguia encontrar a pagina e isso começou a ser muito triste depois de um tempo. Porra, que que tanto as pessoas querem viver ateh os 100 anos, se eh pra chegar numa fase onde você não consegue mais nem identificar os números?).

Bom, eu ajudava os velhinhos a encontrarem a pagina certa a cada musica. E falava com alguns e ouvia eles falarem o que quisessem, mesmo que em algumas vezes não dava pra entender muito bem. Vimos o que a Bruna caracterizou como o casal “The Notebook”. Um velhinho de mao dada com a mulher, e ela com uma cobertinha nas pernas. Ele falava e mudava as paginas do livro pros dois. Ela soh ficava quieta. Ate na hora em que o Don Smith fez uma chamada, ele ergueu a mao por ela. “O amor realmente existe. Quando um deles morrer o outro vai junto,” a Bruna falou.

Teve uma hora em que uma das velhinhas que estava perto de mim olhou pro lado e gritou pra uma outra: ARE YOU ALIVE? (você esta viva?). E nessa hora eu parei de achar aquilo triste e comecei a rir muito.

Vimos ateh uma bandeira dos Estados Unidos num quadro que estava la desde 1912, e um par de ingressos de um show dos Beatles de 1966, que custou $5, emoldurado em outro quadrinho. Veja bem, como um asilo pode te fazer ver coisas que você nunca imaginava que veria. Me fez ver como as vezes vale a pena trocar uma tarde na piscina pra fazer uma coisa diferente. E como eu NUNCA MAIS vou mencionar a expressão crise dos 25 anos, depois de conhecer as pessoas de 90 e poucos de ontem.

Ateh eu ir embora em dezembro tenho um novo compromisso nas tercas feiras de tardezinha então =)

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