quinta-feira, 9 de outubro de 2014

Em busca da coroa: quando eu concorri a rainha da faculdade

          



          Dizem que você nunca viveu uma experiência americana completa até ter concorrido a rainha da universidade. Tá, não dizem isso. Eu que comecei a dizer, depois dessa semana. 

           Há uns meses eu decidi seguir a máxima "diga mais sim do que não", e estou levando isso muito a sério. Dito isso, numa linda noite, menos de 12 horas antes do deadline pra entrega das inscrições para rei e rainha da Universidade de Pittsburg State (onde faço mestrado), o meu vizinho bateu na minha porta  e soltou a seguinte frase: "Val, você quer ser rainha?". O Igor é do Cazaquistão, e eu e ele, além de morarmos no mesmo prédio, estamos juntos na International Student Association, que representa os 500 alunos estrangeiros que temos no campus. Seguindo a minha máxima, portanto, a minha resposta foi "sim, por que não?". Confesso que não medi os prós e contras na hora, e depois de apenas um dia começou a me bater um arrependimento - porque todos os meus amigos do Brasil começaram a me zoar muito. Mas daí não tinha volta, e eu pensei que, como a oportunidade tinha, literalmente, batido a minha porta, era melhor encarar como mais uma história pra contar. (tipo a história de quando atravessamos sete estados de ônibus popular, ou a de quando morei na frente da casa do traficante de metanfetamina, ou a de como o Spring Break mais louco da história acabou em lágrimas, e assim vai). Adoro minha lista de histórias dos EUA =) é praticamente uma tragicomédia. 


Eu e o Igor em nossa primeira foto oficial lol com o fundo de bandeira americana 
só pra constrastar com nossas nacionalidades exóticas


         O Homecoming é uma grande tradição americana. Nas faculdades, é uma semana de muitos eventos, que acabam com um desfile, tipo 7 de setembro, na maior rua da cidade (no caso da pequena Pittsburg, a única rua, que pretensiosamente se chama Broadway). Um rei e uma rainha são escolhidos como Homecoming king e queen, e os concorrentes são dois representantes de cada organização do campus. E os escolhidos têm a função de representar a faculdade por um ano. É diferente do Homecoming dos colégios, que acaba com baile, aquela coisa que vemos na TV.

          Confesso que eu aceitei concorrer a rainha na brincadeira mesmo, "ha ha ha concurso de rainha, que coisa de filme", eu pensei, "isso vai dar uma matéria engracada pra qualquer revista ou jornal que quiser comprar"... até pensei na ironia na pessoa que passou a vida na terra da Rainha da Festa da Uva (Caxias) pra acabar se metendo num concurso de rainha no meio do Kansas... só que o que aconteceu, confesso novamente, foi que eu comecei a entrar tão de cabeça no negócio, e tomou tanto do meu tempo e esforço que chegou um dia que eu estava "quer saber? eu quero ganhar essa coroa também". 

          Não ganhei (spoiler alert), mas o espírito de competitividade tomou conta de mim. Eu aprendi muitas coisas com esse concurso (e isso não é papo de candidata). Aprendi que gosto mais de competir do que pensava, que posso falar em público sem desmaiar, e que posso até andar de salto de uma forma elegante. E aprendi que o Homecoming não é um concurso de beleza e popularidade bobo como eu pensava no início - e como talvez muitos estejam pensando agora (espero, ate o final desse texto, fazer voces mudarem de opiniao). É uma tradição muito significativa pra cidade toda, e eu realmente acabei me sentindo feliz por ter tido a chance, como uma brasileira, de estar representando todos os outros internacionais do nosso campus. Diferente das outras 25 candidatas, eu não sonhava com isso desde pequeneninha, mas, super por acaso, acabei tendo a chance de viver isso também - mesmo não sendo nem parte da cultura que eu fui criada. 



         Mas vamos ao concurso. Depois que eu disse sim pro Igor, nós tivemos de entregar nossos currículos com notas, empregos, posições de liderança, envolvimento no campus e trabalho voluntário que tínhamos feito. Dessa seleção de mais de 50 participantes, eles selecionaram 36 candidatos (aquela minha vontade de vencer começou a ser alimentada nesse exato momento). 




          O próximo passo foi exaustivo, mas bom. Um domingo todo de entrevistas pessoais com 9 jurados de Pittsburg. Cada jurado fez perguntas durante 10 minutos, a maioria delas sobre como diabos vim parar em Pittsburg, Kansas (thanks, UCS), quais meus planos pra daqui a 5 anos, e o que eu faço pra fazer dessa cidade um lugar melhor. 

          Se tem algo que eu aprendi morando já há dois anos nos Estados Unidos é o quanto o desempenho acadêmico é importante e, (igualmente importante) é o quanto você se envolve nas atividades fora  da sala de aula, como organizações e trabalhos voluntários. Amo estudar aqui por causa disso: estou envolvida com a Pitt State e a comunidade praticamente todos os dias da semana - sempre me incomodava muito durante os meus anos como aluna da UCS, que apenas íamos pra aula e pra casa, e a universidade acabava ali, naquelas duas horas por dia. Aqui existe um amor pela universidade e um senso de coletividade muito grande, e eu realmente adoro isso. As pessoas amam, sério, AMAM, a faculdade. Tem que ver em dia de jogo, é inexplicável. 

          Eu, além de ir pras minhas aulas, dou aula, escrevo pro jornal e pro anuário e faço trabalho voluntário no asilo e numa escola. Porque aprendi também, que em um intercâmbio, quanto mais você se ocupa, menos saudade você sente de casa - e falei isso tudo pros jurados e eles acharam muito interessante. Foi um dia falando tanto que eu saí de lá zonza. 




Eu e Igor no dia que nos apresentamos para alguns dos internacionais,
 pedindo o apoio deles caso chegássemos à etapa de votação


parecendo muito calmos (look by Mel)


          Uma das coisas mais legais dessa semana, confesso, foi que foi uma semana inteira de usar vestido, se maquiar e arrumar cabelo. E minhas queridas amigas foram as melhores, abrindo seus closets pra mim. 




Minha primeira vez de terninho e pérolas - look by Carol






          Passadas as entrevistas, tivemos um dia de apresentação, no qual eu tive que usar salto (que não usava desde minha formatura, ou seja, 2011), e eu já estava tensa só por esse fato. Em minha mente eu imaginava mil situações constrangedoras - que quando eu fosse chamada no palco eu iria cair da escada, ou então que eu pegaria o microfone e não lembraria mais como falar inglês, que fariam comigo que nem fizeram com a Carrie, que eu desmaiaria ou vomitaria (esses medos básicos que eu também tinha no primeiro semestre que dei aula aqui). Só pensava que eu me embaraçaria tanto ao ponto de virar video campeao de views no YouTube.

          Óbvio que nada disso aconteceu, e o dia da apresentação foi muito tranquilo. Tivemos um jantar antes. Aqui no Kansas, quando eles dizem que vai ter um jantar chique, voce pode esperar o que tivemos: batata recheada. Voce ganha uma batata cozida inteira, abre ela com uma faca, e coloca nela uma variedade de tudo o que ha de mais gordo, desde queijo e bacon, a diversos tipos de manteiga que voce nem imaginava que existe. Muito sofisticado.  Foi bom esse tempo com todos os candidatos porque deu pra conversar com vários deles e sentir que todos estavam igualmente nervosos em relação à apresentação. Mesmo que, pra todos eles, inglês não era a segunda língua. Na nossa mesa, depois que a gente comeu as finas batatas, começamos a pesquisar no celular algumas perguntas do Miss America edições passadas que poderiam ser similares às perguntas feitas a nós na hora, e ficamos ensaiando e rindo. Isso ajudou. 

          Depois, nos colocaram num ônibus escolar (daqueles amarelos, de filme - porque essa semana foi a campeã dos clichês), e nos levaram pro auditório da apresentação. Sentamos no palco (os 23 reis e as 26 rainhas), e, um a um, éramos chamado lá na frente, pra responder duas perguntas-surpresa. O auditório estava muito lotado, porque as pessoas aqui adoram esse concurso, mas eu estava tão focada naquelas possíveis perguntas, que nem a quantidade de caras intimidadores das fraternidades presentes me deixou nervosa. Nem mesmo o cara sentado do meu lado, que estava surtando, me afetou (ele acabou eleito rei, depois). E eu nem conseguia ver meu coração pulsando e balançando a blusa, como normalmente acontece quando eu fico muito ansiosa pra algo. Dessa vez, por algum motivo, tudo estava ok. 
          
          Até, claro, o momento em que fui chamada. Tudo desligou. Eu não ouvia mais as pessoas gritarem, eu nem ouvi a minha própria voz. A Ale tinha me dito que na vez dela, ano passado, tudo ficou preto, entao eu estava agradecida que ao menos eu ainda tinha visao. Respondi uma pergunta sobre as mudanças que gostaria de ver no campus em 25 anos e depois uma pergunta sobre qual filme seria a minha vida, se eu tivesse de escolher um. Nessa segunda pergunta nenhum filme vinha a minha mente, sem ser Titanic. Apesar de eu DAR AULA sobre filmes, eu tive um branco total sobre qualquer produção cinematografica que não fosse Titanic. E, como não fazia sentido algum eu comparar minha vida com um navio afundando - pelo menos não no momento - eu acabei dando outra resposta, que seria um filme de uma brasileira e que escolheriam uma atriz brasileira pra me representar por causa do sotaque. De alguma forma, os americanos acharam essa parte engraçada, e a minha audição, a essas alturas, tinha voltado a funcionar, então até escutei as pessoas rirem. O objetivo era responder bem a primeira pergunta e conseguir ser engraçado na segunda (e você achando que era fácil ser candidata a rainha hein?). Gente, não é fácil ser engraçada. Em público. De salto. Em inglês. 


eu no momento fatídico. click por Mel,
obrigada por registrar isso para a posteridade
          



com a candidata do ano passado, e também minha melhor amiga, que me ajudou em tudo, desde a ensaiar respostas, emprestar sapato e dizer "você nunca mais vai querer fazer isso na vida"



         Mas teve gente que se saiu muito bem nessa apresentação. Todos os candidatos estavam muito preparados para essas perguntas - e para falar em público (teve gente que se preparou desde o ano passado pro concurso. Tinha gente, aliás, que estava concorrendo pela segunda vez). E mesmo que eu e o Igor não tenhamos ido mal (ou pelo menos não tenhamos passado fiasco), acabamos não ficando entre os top 6 finalistas, que foram anunciados naquela noite. 


Com Mel, também de Caxias



no dia da coroação, com Igor e Stephanie, que é
nossa coordenadora do International Student Association

           De qualquer forma, valeu 100% a pena. Nunca mais fico com medo de falar na frente dos outros depois daquela noite. Dar aula virou moleza agora. Pro pessoal do International Office aqui, somos rei e rainha mesmo sem termos ganhado o título, como eles nos disseram depois. E valeu por pelo menos termos mostrado que quem não é americano também têm bom curriculo, boas notas, e sabe se dar bem em entrevista e em apresentação. Ainda tem muito preconceito e estereótipo aqui. Uma das candidatas americanas, no final daquela apresentação, me disse "nossa como tu respondeu bem, eu estava com medo que tu não iria entender as perguntas!". Então acho que pelo menos a nossa participação serviu pra mostrar que nós sabemos falar inglês. 

          Brincadeiras à parte, pra mim, pelo menos, o concurso serviu pra mostrar que realmente, a vida é muito mais divertida quando você decide dizer mais sim do que não =)     Mais uma história pra minha lista, check. 



as top 6



nós e o anúncio da vencedora



a rainha e o rei =) 


          Abaixo, as fotos da parte MAIS LEGAL da semana, quando eu e o Igor desfilamos de Harley Davidson abanando pras pessoas da cidade. Inesquecível (igual diria uma embaixatriz da Festa da Uva). 







Nenhum comentário:

Postar um comentário